sábado, 7 de dezembro de 2013

O G-4 e a depreciação do Campeão


O Flamengo foi mal do Brasileirão?! O Cruzeiro foi campeão?  Quem se importa?
Mais um Brasileirão da "Era dos pontos corridos” chega ao fim. Só falta bater o ponto e apagar as luzes antes do pano cair, burocraticamente. Ou alguém vai sentir falta? Provavelmente, só a torcida do Cruzeiro, por conta dos golaços do Éverton Ribeiro, porque, tirando isso, que estorvo de Brasileiro...

O sistema de disputa é tão chato que o objetivo anunciado pelas equipes (e inflado pela mídia) deixou de ser o título; ninguém admite mais querer ser campeão da parada, mas integrar uma sigla abstrata (G4) e desacreditada (porque deverá virar G3). Para os jogadores, esse discurso é interessante porque tira um pouco da responsabilidade ante a torcida de se prometer o título - “nossa meta é estar entre os quatro primeiros”! Já para a mídia, em geral, e para a detentora dos direitos televisivos, o mesmo discurso estimula um número maior de torcedores a seguir os jogos, afinal, a distância entre o seu time e o “novo” objetivo será sempre muito menor que para a conquista do campeonato – nada como o bom e velho “são muito mais chances de ganhar” para atiçar as massas. No meu entendimento, é um tiro que saiu pela culatra, uma vez que antes os times se digladiavam por 8 vagas de disputa para a fase de “mata-mata”, tornando a disputa muito mais acesa, entre mais equipes e por mais tempo – até a última rodada da fase de classificação, por assim dizer.

Se, nas últimas semanas (onde até a Fernanda Lima ganhou mais espaço na mídia que a última rodada do campeonato), estivéssemos contemplando o espetáculo de uma boa e velha semifinal, duvi-deo-dó que algum dos quatro clubes envolvidos na virtual disputa pelo título estivesse tão conformado, simplesmente, com a vaga para a Libertadores, como ora se vê no semblante dos atuais possíveis contemplados. Estariam, isso sim, com a faca entre os dentes para alcançar à final, e depois para conquistar o caneco. Caso não obtivessem êxito, a vaga para o torneio continental os afagaria o ego combalido... Qual nada! O que era consolo para os perdedores de ontem se tornou troféu para os falsos vencedores de hoje! O conformismo é generalizado, ou duvidam que neste Domingo haverá neguinho chorando a torto e à direito pelos campos do Brasil?

 Se der Furacão, Paulo Baier será o chorão-mor, puxando fila, com Luiz Alberto logo atrás, se debulhando em lágrimas: ex-rejeitados, ora amados!

Se der Goiás, será a redenção dos gordinhos brasileiros verem Walter levar o Esmeraldino à Liberta, e testemunharíamos muitos desses fofinhos emocionados pelo Brasil afora, com os olhos marejados e grudados na tela da TV, com sorvetes e guloseimas à mão, empanturrando-se sem o menor peso na consciência...

Se der Botafogo, então, será o caso de se usar as imagens do desacreditado triunfo para produzir uma novela mexicana, tal o chororô que os devotos da Estrela Solitária costumam produzir, com ou sem motivo, sendo imbatíveis no quesito. Apesar de considerar improvável, este escriba torce pelo Glorioso, não só pelo bem da auto-estima alvinegra, mas como uma singela forma de homenagear Nilton Santos – A Enciclopédia. E se miraculosamente der o Leão da Barra, veremos toda a torcida do Vitória chorando de alegria, enquanto a do Bahia fará o mesmo, mas de tristeza.

E todo esse caudaloso rio de lágrimas e emoções, para que mesmo, intrépido torcedor? Para ser 3º ou 4º no campeonato!!! Pode isso, Arnaldo? Pode o cidadão se contentar com uma desgraça dessas? Ainda mais sob o risco de pagar, à prestação, um micão para a Macaca (que deve roubar a vaga ganhando a Sulameriquinha)? O que significa dizer, diletos arquibaldos do novo milênio, que quem se classificar na quarta colocação não terá qualquer razão para comemorar de antemão; terá, isso sim, de esperar três dias após o término do certame para, então, receber sua possível bênção... Ridículo, patético e catastrófico, não? É a pegadinha do Brasileirão!

O Flamengo, por exemplo, fez seu torcedor passar vergonha durante o ano inteirinho, mas acabou conquistando a vaga no susto, por outros meios. O time é fraco, mas a massa rubro-negra está rindo de orelha a orelha porque, afinal, está entre os melhores da América!  

Um campeonato que mexe com as emoções de milhões, como é caso do Brasileiro, jamais poderia se tornar tão desinteressante, a ponto de ser vendido como uma mera ponte para Taça Libertadores, configurando-se numa distorção de valores que em nada contribui para sua mística. Como se já não bastasse a falta que uma final faz à memória do futebol e do torcedor, agora isso?... Tenha dó!




imagem: marcya reis



6 comentários:

  1. Discrepo. Não acho que o Brasil precise de um campeonato com finais decididas em mata-mata. Quem disse isso? Quartas de final, semifinais e finais nais com mata-mata em ida e volta significa que doze times terão folga pelo menos três semanas antes. Porque eles e suas torcidas têm de ser punidos assim? E quem falou que os times remanescentes atrairão o interesse de toda a população que acompanha futebol? Isso só ocorre em média uma vez por década, com times fora de série, como o Internacional de Figueroa e Falcão, o Flamengo de Zico e Adílio e o São Paulo de Telê. Muito mais natural é, por motivos diferentes (fugir da degola ou conseguir vaga em torneios continentais), haja jogos atraindo públicos diferentes até a última rodada.

    É preciso ter na cabeça que o futebol profissional não representa a essência do povo brasileiro, não tem de ter a capacidade de parar o país. O mundo gira, a Lusitana roda e ninguém tem de parar para ver um jogo que não te interesse, assim como os EUA não param para ver o Superbowl.


    O torneio disputado em pontos corridos não é anódino. O Cruzeiro este ano foi campeão por seus méritos. Se o nível técnico geral foi ruim, a conversa é outra. Querer invocar a emoção para ressucitar a decisão em mata-mata é apelar para um espírito que não tem a obrigação de existir. Não temos de ser a pátria de chuteiras.

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    1. Caro Márcio, não há verdades absolutas ou incontestáveis. E não há, da minha parte, interesse em passar essa ideia, ainda que eu tenha, creio eu, todo o direito do mundo em expressar o que sinto e o que aprovo ou não, como torcedor, em relação ao futebol brasileiro - não foi por outra razão que criei o Borogodó Futebol Clube. Tenho, inclusive, o direito de ser saudosista ou nostálgico, contanto que o leitor compreenda minhas razões, o que obviamente não é o caso.

      Não afirmei que tem de ser assim ou assado, mas busquei nos 10 anos de história do atual campeonato, aspectos me são enviesados e até indesejáveis numa fórmula como a dos pontos corridos. Mas você tem todo o direito de gostar de situações esdrúxulas numa rodada final. Para mim, no entanto, todas as antigas finais de Campeonato Brasileiro estão gravadas em minha memória, enquanto que para falar dos 10 últimos campeões, há de se fazer um certo esforço e buscar na lembrança quem foi o vencedor; só posso entender que algo me atrai mais numa forma de disputa que na outra. Quando o meu Flamengo foi campeão (em 2009), por exemplo, estive no Maracanã na rodada final, e posso afirmar que foi um sentimento estranho pelo fato de jogar contra um adversário que, sabidamente, queria perder (pois se ganhasse, daria o título para o Inter, seu arqui-rival). Muito mais emocionantes foram as finais de Carioqueta e de Taça Guanabara que presenciei, com um Maracanã lotado e dividido. Em 85, o mengo tinha sido eliminado pelo Brasil de Pelotas, o que não me impediu de acompanhar a finalíssima entre Bangu e Coritiba com enorme entusiasmo, até a última cobrança de penalidade desperdiçada pelo Ado, que deu o título ao Coxa, calando os 100 mil pseudo-banguenses presentes; isso é futebol! Isso é emoção!

      Sociologicamente as experiências ganham importância devido à significação que recebem por parte da sociedade, e nesse sentido, a cultura brasileira é, sim, voltada para o embate final. Inserir conceitos como "justiça" para justificar o novo estilo é, portanto, contrário ao que nossa cultura produziu até então. Se isso vai ser metabolizado pela população, num processo antropofágico post-modernista, isso é outra história e cabe ao tempo nos dar a resposta. Até então, no entanto, o que vejo é uma tentativa de se vender o novo produto sem que haja, de fato, aceitação do mesmo por parte das massas. Certamente você pensa diferente, mas comete um grave erro quando subestima a importância do futebol no inconsciente e no cotidiano do povo brasileiro, e o fato do País costumar parar em época de Copa ou em finais de Campeonato corroboram essa tese. Se a Nike, a CBF e a tal profissionalização do futebol vão mudar esse panorama, então assim será, embora até agora não o seja. O futebol é parte constitutiva do nosso Povo, e se o nome disso não é essência, então perdi essa classe e não sei mais do que sou feito. Se você não se sente assim, o Superbowl está aí pra isso; it's all business, man!

      E por mais que você não entenda assim, Márcio, eu seria capaz de apostar que um aficionado por esporte está mais preocupado com emoção do que com justiça. Para mais detalhes, leia Pontos Escorridos

      (http://www.borogodofutebolclube.blogspot.com.br/2012/11/pontos-escorridos.html)

      Grande abraço ,

      El D.T.

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  2. é preciso ter uma reviravolta no futebol, pois, os cartolas estão emperrando cada vez mais seus clubes para baixo, e digo isso não porque o Vasco da Gama ou o Fluminense caiu, mas sim pelo nível técnico apresentado pelos jogadores, condições dos gramados, calendário mal organizado, domínio da mídia sobre o futebol e outros esportes, ailiás mídia essa que é a principal influencia no mundo esportivo e por último os grandes salários de uma minoria de jogadores, que a maioria não sabe sequer dar uma entrevista. Mas como isso é Brasil, é tudo normal até o Botafogo ficar quase todo o campeonato e com o sonho mediocre de participar de uma libertadores, onde na verdade deveria era estar buscando o título. Mas isso é Brasil, pra tudo tem um culpado ou uma justificativa. A CBF vai continuar dando as cartas e os meios televisivos ira manipular não só os clubes, mas muitas vezes até os torcedores.

    Walter Bueno

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    1. Dileto 3194,

      concordo com suas críticas à estrutura do futebol brasileiro. Mas, do mesmo modo que justifico meus pontos de vista amparado na análise sociológica e cultural do nosso Povo, no caso dos cartolas, não haveria de ser diferente! Impera nesses feudos a mesma lógica do tempo do Rei; quem for amigo ou aliado, ganha sua capitania hereditária e que se dane se ela é bem ou mal administrada. Uma vez Senhor, tudo o que você tem de faze é usá-la em seu benefício, e não daqueles que a terra habitam - é ou não é a mesma lógica que impera nos clubes? Não bastasse as décadas de descalabro, ainda vem o senhor Aldo Rebelo querer perdoar a dívida de mais de 4 bilhões que os clubes tem com o FISCO; sinal aberto para mais roubalheira!

      E pensar que Mr. Teixeeeeeira está por aí, rindo de tudo...

      Grande abraço,

      El D.T.

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  3. "Oh! que saudades que tenho
    Da aurora da minha vida,
    Da minha infância querida
    Que os anos não trazem mais!
    Que amor, que sonhos, que flores,
    Naquelas tardes fagueiras
    À sombra das bananeiras,
    Debaixo dos laranjais! ..."

    Valho-me dos versos de Casimiro de Abreu para reforçar que é perfeitamente normal valorizar muito ou mesmo mitificar o que vivemos quando crianças/jovens. Estranho quem não faz isso.

    Assim, é natural que você prefira a disputa em mata-mata. Respeito sua opinião, mas permito-me discordar. E discordo completamente de que a cultura brasileira seja voltada para o embate final. Não há prova que sustente tal afirmação. Tomemos como exemplo o expoente mor da cultura brasileira, que é a música: aqui não há espaço para embates e sim para o prazer, em vários níveis e momentos, para todas as idades e gêneros. Onde está a disputa, o embate? Nenhures!

    Atenção para o que escrevi: minha restrição é em relação ao futebol PROFISSIONAL. O futebol amador/para lazer de tantos milhões em todo o país sempre será uma característica fortíssima do Brasil. Já o futebol profissional vem perdendo, por vários motivos, muito desse vínculo mais forte com a sociedade. E não é por causa dos pontos corridos ...

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    1. Beleza pura! Com argumentos é mais fácil dialogar, já que agora você se posiciona de maneira mais clara em relação ao que você pensa sobre o assunto, sem lançar mão de provocações rasteiras.

      Então vou me explicar melhor também. O blog é sobre futebol, e teoricamente eu posso falar sobre tudo relacionado ao esporte, No entanto, minha ênfase absoluta é no futebol profissional. Creio que todos os textos até hoje publicados tenham ligação com aquilo que acontece no mundo do futebol profissional, sendo, portanto, natural que ele seja o paradigma do Borogodó.

      O lance, Márcio, é que o futebol profissional nem sempre foi assim, um tremendo negócio. Dizem, no entanto, que ele se "modernizou" (quanta subjetividade!), sendo, pois, redefinido enquanto esporte e/ ou forma de expressão cultural e lazer. Nesse sentido, acho um descalabro você dissociar a história do futebol brasileiro à essência do povo brasileiro. O futebol foi, por exemplo, responsável por oferecer uma das primeiras formas de ascensão social ao negro que, poucas décadas antes, ainda era escravo. Foi também o futebol quem possibilitou ao gênio de Nelson Rodrigues definir a alma vira-lata dos brasileiros. E foi também o futebol, um esporte global, quem colocou o Brasil no topo do imaginário popular, fazendo com que este mesmo povo complexado se identificasse apaixonadamente com as cores e com a bandeira pátria por conta dos 5 títulos mundiais conquistados, por causa de Pelé, por causa de Garrincha... Não me diga, portanto, que o futebol profissional não representa o Brasil ou o Povo Brasileiro. Bem diferente, contudo, é constatar que isso (esse elo) esteja se desfazendo justamente por conta da tal modernidade candente imposta ao outrora esporte popular - que é exatamente o foco da minha crítica.

      Em português claro, você acha que o cartaz que o futebol brasileiro tem, mundo afora, é por conta das peladas de várzea?

      Voltando ao prelo, o que você diz em relação à minha afirmação é correto; de fato, nada corrobora minha tese de que o brasileiro tenha pendor para o embate - e o exemplo da música é excelente (ainda que Herivelto Martins e Dalva de Oliveira tenham ressalvas. Quis dizer aquilo em relação ao futebol, especificamente. Até ver uma pesquisa convincente que prove o contrário, vou confiar em minhas fontes pessoais para afirmar que a uma grande final é, simbolicamente, algo especial a todo torcedor brasileiro. Esse papo de campeonato "justo e equilibrado" é, NA MINHA OPINIÃO, um pé no saco; ou, como se diz na Terrinha, tremenda bôca disifudê. E tento, na medida do possível, dialogar com o torcedor a fim de constatar se estou ou não falando sozinho.

      Prefiro manter a alma e a dinâmica da vida atreladas ao meu saudosismo que cair nessa roda-viva que me dilacera o espírito e ceifa as raízes da nossa cosmologia: ... "nenhuma vontade ou poder humanos pode se permitir [como faz a FIFA, por exemplo] dar passos de forma arbitrária, nenhuma vontade ou poder humanos pode se permitir caprichosamente saltar distâncias e realizar sínteses [oportunistas], devendo, pois, seguir a precisa lógica interna das coisas.", escreveu o sociólogo Georg Simmel, com inserções minhas. Tudo depende do que você entende por "coisas", certo?

      Abração!

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